Há muito o que se dizer sobre a pandemia de Covid-19, o assunto não se esgotará,
não por hora com certeza, pois atingimos a marca das mais de 500 mil
mortes/ausências, no Brasil. A ciência responde prontamente essa doença, nunca
tantos trabalharam tanto para salvar vidas. Ciência e Saúde estão muito bem
definidas, defendidas, aclamadas por todos os Homens de boa vontade. Há um
aspecto que precisa ser trazido à luz: o importante papel das Ciências Humanas
– as Humanidades, nesse processo de adoecimento mundial. O conhecimento sobre a
condição humana, necessidades da sociedade, as diversas problemáticas
educacionais, ambientais, sociais, culturais, artísticas, religiosas, políticas
e filosóficas que a pandemia produziu, além da óbvia: saúde.
Análise cronológica dos grandes momentos de doenças
devastadoras da história humana, nos remete a Peste de Atenas- séc. V a. c., a
Peste Antonina - séc. II, a Peste Justiniana - séc. VI, a Peste Bubónica ou
Peste Negra - 1347 a 1351, a Gripe Espanhola - séc. XX, além de varíola, gripe,
VIH,Ébola, e mais recentemente, os surtos de síndrome respiratória aguda grave
SARS – 2012 e COVID-19, revela a grande capacidade adaptativa do Homem, no
reagir, resistir e superar, provocando ajustes importantes e profundos no
estilo de vida.
As Humanidades, da história à arte, há espaço de
estudos para entender e lidar com a pandemia.
Transformações sociais e o impacto na população, compreender a
consternação da comunidade em luto, a perda de renda por conta do desemprego,
os novos desafios agregados à educação, a mudança de comportamento necessária
para a prevenção e controle da doença, as anormalidades sociais, as questões
ambientais, o processo em que o indivíduo se solidariza, em um mundo doente.
Na contemporaneidade, conhecimentos que não possuem
aplicação evidente, são considerados inúteis. Essa visão prejudica o olhar para
as mazelas sociais e a compreensão da vida em sociedade, elementos fundamentais
para a construção de uma sociedade justa, democrática e igualitária.
Margaret Mead, antropóloga, considerou o primeiro
sinal da civilização sendo um fêmur de 15.000 anos. Esse osso apresentou
evidências que havia sido quebrado e cicatrizado. Em sociedades sem os
benefícios da medicina moderna, leva cerca de seis semanas de descanso para a
cicatrização de uma fratura. Um osso fraturado era uma sentença de morte àquela
época, já que deixava vulnerável o indivíduo aos predadores e não poderia se
alimentar, caçar, procurar água. Se esse fêmur teve tempo para se curar é
porque alguém o acolheu, cuidou, providenciou comida, abrigo. Segundo Margareth
Mead ajudar, apoiar alguém durante a dificuldade é onde a civilização começa.
“Quem canta seus males espanta”, expressão do poeta
romano Virgílio, citada depois em Dom Quixote de Cervantes. A música é
considerada como a arte mais antiga e primitiva de todas. Em noite
especialmente fria e chuvosa lá na reserva indígena de Dourados/MS, perguntei
para algumas crianças, como lidavam com a situação e a resposta foi tocante:
“nós cantamos”. O que remete a Friedrich Nietzsche: “Somente a arte pode
transfigurar a desordem do mundo em beleza e fazer aceitável tudo aquilo que há
de problemático e terrível na vida”.
As Ciências Humanas trazem um conhecimento para a
vida, a análise crítica e questões relacionadas à sociedade, à cultura e à
humanidade, tão necessárias, uma vez que o Coronavírus não é uma questão apenas
biológica, mas também social.