Desde sua criação, a Diocese de Jales vem cumprindo
sua missão de evangelizar, incentivando a prática dos valores comunitários do
povo que, diante das necessidades, ocupa espaços de luta contra a desigualdade
social e protagoniza ações de solidariedade, como fazer uma colheita de café de
um companheiro doente.
Sou parte dessa história por ter trabalhado de 1971 a
1989 nas regiões de Paranapuã e São Francisco, na formação de lideranças das
pastorais, na catequese, nos grupos de famílias, na horta comunitária eem
alguns serviços diocesanos, como produção de subsídios para comunidades,
vocações e juventude.
Trabalhar nessa Diocese foi um aprendizado, uma formação
para continuar a missão em outras situações, como o envolvimento na 2ª Semana
Social Brasileira, presença com recicladores e moradores de rua em Belo
Horizonte, projeto com os índios Xerente, em Tocantins,e enfrentamento à
violência doméstica e sexual contra crianças e adolescentes.
A vida nos traz surpresas e imprevistos: perda de uma
amizade, doenças e mortes. Acontecem também, num âmbito maior, como a queda do
muro de Berlim e das torres gêmeas de New York. Com os recursos da ciência,
algum infectologista, cientista, previu que todo o planeta, em pouco tempo,
seria ameaçado por uma pandemia?
Em pleno século XXI, o coronavírus nos obriga ao
distanciamento social, à interrupção de nossas atividades diárias, para evitar
a contaminação em massa, que geraria colapso no sistema de saúde. Acreditávamos
que sempre iríamos ganhar tudo no grito, na violência, que o mundo teria que
nos servir e a natureza sempre ser explorada! Chegamos a pensar que fôssemos
máquinas, capazes de trabalhar sem parar em busca de bens.
Hoje, muitos de nós tememos a morte, questionamos que
vida queremos e que mundo deixar para as crianças e adolescentes. Estes
estranham o mundo em que vivem, por isso se cortam, falam em suicídio, jogam-se
nos vícios. É preciso gerar uma nova maneira de ser e conviver entre nós e a
natureza. Estamos vulneráveis porque essa Covid-19 não faz distinção de classe
como a gastroenterite que mata milhares de desnutridos.
Diante da pandemia, podemos escolher entre dois
caminhos: aguardar que siga seu curso, acreditando que, cedo ou tarde, vai
passar, e retornaremos ao “normal”; ou acolher esse tempo como desafio para
refletir e tomar decisões coletivas de respeito ao outro na solidariedade, na
construção da civilização do amor, da paz e da justiça social.
Evangelizar, hoje, tem que ir além de palavras bíblicas.
É preciso que a boa notícia chegue aos corações voltados para si mesmos: uns
não seguem orientações sanitárias, outros compram todo o estoque de álcool e
máscaras de uma farmácia. Felizmente, há pessoas que se oferecem aos mais
vulneráveis para compras, que divulgam telefones para idosos que queiram
conversar e que levam lanches nos hospitais para quem dobra sua carga horária.
A conversão tem que passar pelas estruturas, de modo
que a riqueza deixe de ser objeto de cobiça corrupta, de apego individual e
seja um sonho para a coletividade. Assim como o SUS, apesar das limitações, é
uma riqueza para o povo brasileiro, que também o saneamento básico, a educação,
a moradia e a renda mínima sejam acessíveis, através de políticas públicas
consistentes, para a superação da abismal desigualdade social.
Belo Horizonte, 28 de maio de 2020.