Tendo chegado aos 80 anos, sinto o desafio de passar em
revista a história, e conferir os principais eventos que lhe deram forma.
Uma primeira constatação emerge com evidência: foram anos de grandes transformações, efetuadas sobretudo por um número impressionante de guerras, que de certa maneira continuaram as tensões da segunda guerra mundial.
Para entender as consequências práticas desta guerra, precisamos ter presente a famosa “Conferência de Yalta”, na Crimeia, realizada de 04 a11 de fevereiro de 1945, quando já se tornava irreversível a vitória dos aliados. O grande equívoco desta conferência foi aceitar a proposta de Stalin, de que cada país vencedor estabeleceria suas fronteiras onde o seu exército tivesse chegado. Mas era bem diferente a intenção das partes. Enquanto os aliados já pensavam como fomentar o desenvolvimento dos países derrotados, a União Soviética procurava maneiras de fortalecer seu domínio sobre eles.
Isto explica por que foram surgindo novos focos de confronto, entre o Leste e o Oeste, que tomaram a forma de “guerra fria”, que durou do fim da segunda guerra mundial, até o esfacelamento da União Soviética em 1991.
Podemos identificar uma sequência de confrontos, que tomaram a forma de conflitos localizados, mas com significação mundial. Entreeles dá para citar a “Guerra da Coréia”, de 1950 a 1953, e “Guerra do Vietname”, de 1959 a 1975. Estas foram as duas guerras que melhor assinalavam a intenção de marcar posição e estabelecer limites entre as duas grandes potências mundiais.
Em 1948 foi criada a ONU – Organização das Nações Unidas, com a intenção de se iniciar um lento processo de governança mundial. Processo que não vingou, por conflitos de interesses nacionais, e pelo estatuto do “veto” concedido a algumas potências mundiais, no caso, a União Soviética, Estados Unidos, China, França e Inglaterra. De mal modo que a ONU foi perdendo a eficácia política, sem conseguir realizar sua incumbência original, de evitar conflitos e de favorecer a soluções pacíficas.
Enquanto isto, iam se sucedendo as guerras, em número acabrunhador, ao longo de todos os quarenta anos. Parece que sem guerras o mundo não consegue viver. A começar no primeiro dia após a ONU decretar a criação do Estado de Israel, em 1948. A esta primeira guerra entre judeus e palestinos sucederam-se diversas outras, incluindo a “guerra dos seis dias”, de 05 a 10 de junho de 1967 e a Guerra do “Ion-Kippur” em 1973.
Outra série de guerras foram as “guerras do petróleo” realizadas em diversas oportunidades nas regiões ricas em petróleo, o que deixa evidente que um dos componentes das guerras é sempre a ganância econômica. Neste elenco situa-se a guerra do kwait, do Iraq, do Afeganistão, e a guerra da Síria, que ainda está em andamento.
A estas todas, somam-se as “guerras de independência”, na África, muitas vezes esquecidas, como consequência trágica dos longos séculos de regime de escravidão imposto pelos países da Europa.
Nestes oitenta anos, graças a Deus, se acelerou o processo de consciência da soberania de muitos países da África, cujo mapa político ficou completamente modificado, contando hoje com mais 50 países africanos. Embora ainda persistam situações de guerra civil em diversos deles.
Infelizmente contar a história desses 80 anos, resulta uma narrativa de contínuas guerras que a situação mundial devia ter evitado.
Mas há outros aspectos, que deveriam ser averiguados com mais atenção.
Do ponto de vista da realidade eclesial, estes anos viram a realização de um Concilio Ecumênico, despertando o sonho de uma grande renovação eclesial. Contaram com uma série de grandes Papas, a começar em 1940 com Pio XII, João 23, Paulo VI, João Paulo II, Bento 16 e o atual Papa Francisco.
Do ponto de vista cultural, esses 80 anos testemunharam a “revolução da juventude”, em Paris, em maio de 1968, que desencadeou mudanças profundas nos costumes pessoais.
Do ponto de vista tecnológico, a chegada do homem na lua levou a avanços tecnológicos muito significativos, que foram incorporados nas novas tecnologias de comunicação, de que o celular se tornou o símbolo mais eficaz.
Os 80 anos não deixam de fazer algumas interpelações, que são inadiáveis. A primeira se refere a duas situações que as Nações Unidas deveriam assumir e resolver. A primeira se refere ao conflito entre Israel e os Palestinos. Que se encontre uma solução, que só pode ser viabilizada por um clima de diálogo entre as duas partes, e de apoio de das nações mais próximas.
A outra situação se refere aos “Curdos”, povo que ficou sem território próprio desde a primeira guerra mundial.
Mas a questão mais trágica é a situação de milhões de pessoas, especialmente crianças, que morrem de fome, abandonadas, sem abrigo e sem nenhum apoio, vítimas de guerras que não tem nada a ver com a triste realidade a que foram relegadas.
Até que existem crianças morrendo de fome, nenhum país, nenhuma autoridade, nenhum organismo das Nações Unidas pode se eximir de sua responsabilidade. Até que existem pessoas que morrem de fome, ninguém deve dormir em paz.
A miséria no mundo é o atestado maior da incompetência e da omissão das autoridades.
É por isto que os pobres julgarão o mundo!